sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

PILOTOS DE TESTE: Querendo ou não, você é um beta-tester

Li o artigo abaixo em uma edição recente da revista Scientific American Brasil e, como o autor, fiquei surpreso que a mentalidade de muitas empresas (e também de muitos desenvolvedores!) seja: vendemos o software depois corrigimos. Ou seja, usam clientes como testadores, porém esquecem de que quando alguém compra um software, o mínimo que se espera é que ele funcione adequadamente... e não que funcione após o Service Pack 1. O mesmo se espera de um serviço... Mesmo que a venda do software como serviço reflita melhor a natureza orgânica da contínua evolução do software, é necessário ter em mente que não se pode vender algo que não funciona. Quando o software, ou serviço, é fornecido de forma gratuita e o usuário é avisado que é um software inacabado sujeito a instabilidades, aí a história é outra, como o próprio autor diz. Cabe ao usuário optar por assumir o risco, ou não, de usar um software gratuitamente.
Acredito que o software tem uma evolução e desenvolvimento constantes. Um dos grandes modelos de negócio que vieram com o Movimento do Software Livre, foi fornecer o software e cobrar pelo serviço de desenvolvimento, suporte, personalização, etc. O mesmo vale para os modelos de software por assinatura, cuja assinatura geralmente é bem mais barata que o preço do software "na caixa", e o usuário recebe atualizações e melhorias constantes. O modelo por assinatura, pressupões melhorias e evolução constante.
Abaixo segue o artigo:

PILOTOS DE TESTE: Querendo ou não, você é um beta-tester
Por: David Pogue

Há alguns anos, dei uma aula na Columbia Business School chamada "O que torna o Sucesso, um Sucesso - e um Fracasso, um Fracasso". Como veterano revisando produtos tecnológicos, há 25 anos, pretendia oferecer o meu conhecimento a esse grupo de jovens idealistas e empreendedores.
Compartilhei, por exemplo, a história do Storm, o primeiro telefone BlackBerry touch-screen. A BlackBerry apressou o produto, cheio de bugs vergonhosos, esperando aproveitar a temporada de feriados de 2008. E nunca mais se ouviu falar dele.
"Nunca trate seus consumidores como beta-testers", concluí. "Acerte seu software de início. É difícil recuperar-se de uma primeira impressão ruim."
Acenei com a cabeça, satisfeito em ter sido claro - quando percebi que três ou quatro mãos se levantaram. Eram de alunos que passavam o verão trabalhando em empresas de software.
"Mas o software nunca está totalmente terminado", argumentou uma jovem. "Você vende algo que está razoavelmente pronto e sempre pode criar uma correção depois."
Fiquei estupefato. "Você venderia seu software sabendo que existem bugs nele?"
Nesse ponto, meus alunos já estavam revirando os olhos. "Professor Pogue, todo o software é vendido com bugs conhecidos. Você tenta consertar os maiores para a versão 1.0, mas depois precisa vendê-lo para garantir a entrada de dinheiro. Você sempre pode fazer o polimento depois." "Sério?", pensei.
No trem, de volta para casa, percebi que eles estavam certos sobre uma coisa: softwares defeituosos não são apenas falhas ocasionais; atualmente, essa é a regra. Empresas de tecnologia rotineiramente tratam seus clientes pagantes como beta-testers gratuitos.
E não são apenas bugs. Atualmente, desenvolvedores de software deixam o feedback do público guiar o projeto fundamental do software: que características ele oferece, como funciona.
Deixe-me esclarecer: eu sou um fã incondicional do financiamento coletivo. A sabedoria das massas sempre derrota a de alguns programadores. É por isso que programas com beta testing são tão vantajosos: fãs de tecnologia podem testar algum produto novo antes da hora (e modelar o seu desenvolvimento), e a empresa recebe milhares de cobaias procurando falhas - de graça.
É por isso que a Microsoft oferece todas as versões do Windows ao público meses antes de estarem terminadas. Este ano, pela primeira vez em muito tempo, a Apple fez o mesmo com o sistema operacional OS X Yosemite. E o Google é famoso por chamar seus serviços de "beta" durante muito, muito tempo. (O Google Docs ficou em beta testing durante três anos; o Gmail, cinco anos.)
Mas esses produtos inacabados são gratuitos e rotulados beta. As coisas se complicam quando empresas vendem produtos - sem dizer à audiência que o software não está pronto.
Parte de nossa insatisfação em receber softwares defeituosos provavelmente vem de nossa própria concepção de software - algo que é, de fato, finito. Softwares costumavam vir em caixas, com números de versões. Nós os entendíamos como marcos - um programa gravado em pedra.
Mas, atualmente, softwares são coisas vivas, entidades em constante evolução. Pense em aplicativos de celular: ninguém parece se importar com versões mais novas sendo lançadas constantemente, várias vezes ao ano. Ou websites: eles também são softwares, e estão em mudança perpétua.
Talvez seja por isso que a Adobe não produz mais versões encaixotadas e numeradas do Photoshop; em vez disso, a única maneira de obter o programa é se inscrever em sua evolução constante o ano todo.
Talvez seja hora de pararmos de pensar em programas tradicionais de maneira diferente. Talvez devêssemos abandonar edições numeradas e congeladas, como fez a Adobe.
Isso não eliminaria a frustração dos bugs. Mas, pelo menos, compreenderíamos a verdadeira natureza do software: um produto que nunca está terminado.

Fonte: Revista Scientific American Brasil, Ano 13, No. 151, Dezembro de 2014, Página 21.

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